domingo, 9 de novembro de 2014

Bocadinhos de carinho

Uma música, um filme, um passeio, aquela ponte, aquele restaurante, uma expressão engraçada, um passeio, um carro, um livro, aquela citação, um paradigma quebrado, um vestido especial, uma cor, aquela forma de sorrir, uma piada, uma dança, uma história sem sentido, aquela vista, aquela praia, aquele vinho.

Quem passa pela nossa vida deixa um bocadinho de si e leva um bocadinho de nós. Os bocadinhos que nos deixam, depois de passar a saudade, são bocadinhos de carinho que ficam para sempre. Podemos esquecer as pessoas e os sentimentos que tivemos por elas, podemos esquecer os sonhos todos que criámos juntos, podemos já não saber a ordem e o porquê das coisas, podemos esquecer todos os momentos. Mas sorrimos sempre que ouvimos aquela música, sempre que vestimos aquele vestido, sempre que nos falam daquele livro. Chega um dia em podemos até já não saber o que faz aquela dança especial, mas sorrimos com ela. Estes bocadinhos de carinho foram-nos entregues e são nossos, sempre.

terça-feira, 19 de agosto de 2014

Os Comandos do Amor e a nossa leveza

Há uns tempos li uma reportagem sobre os "Comandos do Amor" uma organização que conta com mais de um milhão de voluntários e que actua na Índia, tendo por objectivo proteger casais apaixonados que escolhem ficar juntos contra a vontade dos pais.
Parece simples, mas não é: estes casais têm que abandonar a sua família e abrigar-se em refúgios para escapar às ameaças de morte dos próprios pais - tudo por amor. E é um processo tão, tão comum que existe uma organização e mais de um milhão de pessoas que dedicam parte da sua vida a protegê-los.

Avançando: não é sobre a cultura de castas, casamentos e educação que prevalece na Índia que me apetece divagar. É sobre o amor.
Na verdade, deste lado do Mundo, onde este nosso amor é tão livre que não parece merecer-nos nem lágrimas nem suor nem dores de cabeça, uma história destas tem o seu quê de conto-de-fadas.
Um amigo tentou convencer-me que o fruto proibido também é o mais apetecido para estes casais, e talvez por isso lutem tanto, não por amor mas por desafio - por independência, pelo marcar de uma posição. Talvez. Prefiro pensar que não, prefiro acreditar que de facto ainda existem, no mesmo Mundo que eu, pessoas que realmente amam, de verdade, que vivem e morrem por amor.
Desde lado do Mundo, onde o amor é tão leve que se torna tão insustentável, esta visão de um amor verdadeiro e pesado, intenso e perigoso, mais importante que qualquer outra coisa, oferece-nos a magia que precisamos para continuar a acreditar... no amor.

segunda-feira, 16 de junho de 2014

Uma coisa estranhíssima.

Crescer é uma "coisa" estranhíssima. Olhando para trás, tenho tanta certeza que não me revejo (no sentido de não me reconhecer, hoje, como igual ao que fui) como sei que sou o resultado disso tudo que tenho sido, de há 24 anos para cá.
Tenho uma vantagem: sempre escrevi tudo e sobre tudo e de vez em quando dá-me para reler. Reler essa paixão toda, a ansiedade, os receios, os planos, as lágrimas, os sonhos e os olhares que significavam tanto, é hoje ler uma história bonita que não parece pertencer-me verdadeiramente a mim. As cartas de amor mais antigas já não me fazem chorar nem ruborizar - não me aceleram o coração, confortam-no com a lembrança desses amores que me parecem hoje leves e bonitos, ainda que não saiba dizer com clareza porque começaram ou terminaram. Os planos que tinha, a Carina que imaginava que chegaria a ser, os interesses que me consumiam, a forma como ocupava o meu tempo, aquilo e aqueles que me causavam saudade, tudo isso é hoje uma história - às vezes ridícula, às vezes linda, às vezes dramática. É a minha história e, ainda assim, ou por isso mesmo, apenas uma história.
Conforta-me saber que vivi com intensidade isso tudo que vivi. E conforta-me, ainda um pouco mais, este distanciamento que o tempo faz acontecer, mais que tudo porque é o distanciamento que acontecerá daqui a mais algum tempo em relação ao dia de hoje e de amanhã - o bom e o mau. 

Sempre gostei da palavra relativizar. Tem assumido significados ligeiramente distintos à medida que o tempo passa. Hoje, o que vejo é que tempo nos permite e ensina a relativizar e a maturidade chega exactamente com o tamanho do embrulho que conseguimos relativizar. Há-de ser por isso que os mais velhos são mais sábios. E arriscam menos. A intensidade daquilo que sentimos e o risco que nos dispomos a correr por aquilo que queremos diminui à medida que a serenidade aumenta. Não será uma coisa má. É crescer, apenas.
Na verdade, o essencial fica! E também isso é estranhíssimo. A maneira como vejo o que realmente importa, aquilo que valorizo, o primeiro impulso, tudo isso continua estranhamente semelhante. Não procuro as coisas nos mesmos sítios nem da mesma forma, mas no fundo as coisas que procuro não diferem tanto assim.

E... hoje, como ontem, continuo a gostar de escrever sobre o amor, sobre o tempo, sobre clichés e sobre as pessoas. Lamechices. Estranhíssimo!

*